domingo, janeiro 29, 2017

Geração ar condicionado

             Sem prejuízo das devidas e contínuas excepções, de resto e em especial nas últimas quatro ou cinco décadas a esta parte, cada vez mais genericamente se nasce em hospitais/maternidades com ar condicionado; se cresce e se estuda em escolas com ar condicionado; se é transportado em transportes públicos com ar condicionado; se faz transportar em transporte próprio com ar condicionado; se vive em casas com ar condicionado; se vai ao supermercado, ao centro comercial, ao café, ao restaurante, ao cinema, à farmácia, etc., etc., etc., tudo com ar condicionado. Como seja uma geração para quem tudo o que sejam amplitudes térmicas a baixo de 10º ou 12º e/ou acima de 35º ou 40º graus, em qualquer dos casos positivos, já é logo mediático motivo de noticia e de respectivos alertas amarelo, laranja ou vermelho por parte das instituições oficiais de saúde. O que não deixa de ser compreensível e/ou até desejável, precisamente dentro da e para com a que, a partir daqui, passarei a designar como: geração ar condicionado.  

            Só que a geração ar condicionado, enquanto numa base social crescentemente generalizada tem no máximo cerca de meio século, quando a própria humanidade existe há milhares de anos. Além de que sempre houve e eventualmente jamais deixará de haver os que estão em grande e corrente medida à margem da geração ar condicionado. Como seja que por natureza humana, animal, vital ou universal, com todas as suas intermédias dimensões existenciais, jamais deixou de se viver e morrer, dependente ou independentemente do relativamente recente advento do ar condicionado como uma norma corrente e cada vez mais abrangente. O que faz da geração ar condicionado algo aberrantemente ridícula face à natureza climática e até à própria natureza humana e da própria vida desde globalmente sempre e até há cerca de meio século a esta parte. Claro que quando a humanidade começou original e remotamente a fazer fogo e/ou a vestir-se já estava dalgum modo a condicionar o ar em seu redor e/ou com relação a si humanidade. Mas o que leva a mais um acto aberrantemente ridículo da actual geração ar condicionado, enquanto uma espécie de culto em si mesmo, que é o acto de recorrente e crescentemente virem uns senhores, ditos representantes oficiais dos serviços de saúde nacionais e mundiais aconselhar mediaticamente as populações a protegerem-se quer do frio quer do calor, como se dentro da medida do colectivo e/ou individualmente possível isso não fosse algo naturalmente intrínseco à própria condição humana e inclusive a qualquer outra forma de vida animal, desde sempre.

            Para com o que um concreto paradigma deste aberrante ridículo foi e é o facto de por exemplo alguém que eu conheço tão relativamente bem quanto sempre foi meu vizinho, que inclusive nasceu, cresceu e globalmente viveu/existiu durante décadas em condições que pouco ou nada tinham que ver com ar condicionado, no sentido mais tecnológico e actual do termo ar condicionado, no entanto quando por volta do seu meio século de vida o mesmo fez obras em casa e respectivamente colocou o propriamente dito ar condicionado no mais corrente e tecnológico sentido do termo, neste último caso enquanto algo ainda pouco vulgar aqui por estas provincianas bandas, talvez precisamente também por essa genérica invulgaridade, associada a alguma sua vaidade pessoal, um ocasional dia em pleno café e mais ou menos propositada ou despropositadamente o senhor, meu vizinho, em causa disse/perguntou(-se) num ar muito admirado e importante: _ Não sei como é que as pessoas conseguem viver sem ar condicionado?

            Claro que a anterior frase/pergunta do meu vizinho pode ser interpretada de várias formas, desde logo na nuance de entre viver e sobreviver, sendo que o mesmo poderia estar a querer dizer que sem ar condicionado apenas sobreviveu durante o cerca de seu primeiro meio século de existência própria e que respectivamente passou a viver plenamente a partir de que passou a ter ar condicionado em casa. Mas como tão pouco tem de ser necessária ou absolutamente assim, creio que o aberrante ridículo da sua frase/pergunta se mantém enquanto tal, porque a resposta estava no primeiro meio século da sua própria existência. A partir de que, na actual e crescente geração ar condicionado, não só compreendo como até mesmo subscrevo que por exemplo seja mediático-sanitário motivo de noticia haver (ainda) de todo demasiadas pessoas literalmente sem abrigo e que respectivamente se tomem medidas publicas para protecção dessas mesmas pessoas; agora que os próprios e mais correntemente naturais factores climáticos, como temperaturas de entre 10º positivos e até por exemplo 5º negativos ou acima de 35º e até cerca de 41/2º positivos sejam por si sós motivo de noticia é ao menos para mim um puro, duro e aberrante ridículo, que só faz mesmo sentido numa geração ar condicionado e/ou numa humanidade cada vez mais e mais artificial/tecnológica face à mais pura/ecológica natureza original _ se assim se quiser, com o/as incontornáveis defeitos e virtudes de ambas as partes: artifício humano e natureza original.  

                                                        II Parte

            Em qualquer caso creio que no meu caso sou um relativo outsider face à corrente e crescente geração ar condicionado, desde logo porque salvo onde publicamente não possa escapar ao ar condicionado, de resto nasci, cresci e continuo a (sobre)viver à margem do ar condicionado, no actual sentido mais artificial e tecnológico do termo ar condicionado, inclusive tive o meu primeiro carro próprio com ar condicionado desde há cerca de três/quatro anos a esta parte e mas devido a por norma não ligar o ar condicionado até me chego a esquecer que o carro possui tal faculdade. Além de que sempre vivi em casas sem ar condicionado e inclusive sem isolamento de portas, de janelas e de telhados, sendo que quando recentemente fizemos obras em casa, com estrutural melhoramento do isolamento de portas, de janelas e de telhados, também nos desfizemos da lareira que existia originalmente em casa, até porque sem o recente isolamento estrutural já havia anos que não acendíamos fogo na lareira, inclusive porque os Invernos são em média cada vez mais termicamente amenos, pelo que com um pouco mais de estrutural isolamento térmico da casa e correspondentemente estrutural condicionamento do ar no seu interior, a lareira só estaria a ocupar espaço. Sendo que para alguma mais inusitada urgência, confessamente não deixamos de possuir um irradiador a óleo, mas que só ligamos mesmo muito pontualmente _ com eventual possibilidade de virmos de futuro a colocar ar condicionado com base em tecnologias ditas ecológicas. Mas entretanto e no que ao meu caso respeita, enquanto relativamente extra geração ar condicionado desde logo a partir do próprio lar familiar original e ainda actual; se adiciona ainda o facto de eu ter frequentado escolas sem ar condicionado; da esmagadora maioria das minhas actividades laborais/profissionais terem sido e serem executadas ao ar livre ou pelo menos alternada e correntemente de entre o interior de edifícios ou de veículos e o clima natural _ vulgo ar livre. Inclusive e curiosamente ou não, a frase/pergunta do meu vizinho: _ Não sei como as pessoas conseguem viver sem ar condicionado?, foi proferida num café onde, num contexto colectivamente mais alargado, ocasionalmente nos encontrávamos também eu e o próprio no final dum dia de trabalho de ambos, sendo que há altura este meu vizinho trabalhava na Câmara Municipal local, ainda que eu não saiba qual era a sua função lá, enquanto eu trabalhava nos projectos agro-florestais, em concreto plantando materialmente árvores a partir das sete da manhã, normalmente sobre a geada matinal a estalar debaixo dos pés, sendo que mais das vezes de entre o ponto de partida (sede empresarial) e o ponto de chegada (local de trabalho) havia umas dezenas de quilómetros de entre meio, com o transporte de pessoal, incluído o meu caso concreto, a ser processado em carrinha de caixa aberta, que mesmo com um toldo a proteger a frontal e as laterais da caixa, no entanto a traseira estava em aberto, com frequentemente de entre uma a duas horas de viagem durante o auge de gélidas madrugadas. Como seja tudo isto reiterada e literalmente à margem e/ou mesmo ao invés da geração ar condicionado, inclusive ainda por uma vertente algo irónica que era e é o facto de, como humanamente desde sempre, dentro da medida do possível eu e quem mais me acompanhava nestas lides laborais/profissionais e de respectivo transporte, não deixasse-mos jamais de na medida do possível nos proteger-mos das inclemências climáticas, designadamente do frio, mesmo sem os recentes e cada vez mais mediaticamente comuns alertas amarelos, laranja e vermelhos face ao clima (frio e/ou calor), sob correspondentes recomendações das entidades oficiais de saúde para com essa protecção. O que com extensão a toda a história humana, foi como se também ainda eu e os meus pares estivéssemos à frente do nosso próprio tempo, na medida em já nos abrigávamos natural e espontaneamente do frio antes mesmo do frio ser mediático alvo de noticia e dos respectivos avisos sanitários pró abrigo face a esse mesmo frio. Enfim parece-me a mim que há correntemente demasiados noticiários e/ou demasiado tempo de noticiários mediáticos, com tudo o que isso implica técnica, humana, económica, financeiramente, etc., pelo que à falta de melhores ou mais estrondosos motivos de genuína noticia passou a fazer-se noticia até do que é normal e corrente, por vezes até com alguma inversa contradição, pois que por exemplo e a meu ver seria muito mais motivo de noticia o facto de cada vez mais, como por si só no caso concreto do corrente Inverno, pelo menos até meio de Janeiro, estar a ser genérica e medianamente mais quente do que o comum, inclusive o normal frio Invernal que chegou a partir do final da primeira metade de Janeiro, ainda que já devesse ter vindo há cerca de um mês e meio a dois meses atrás; sendo ainda que por mais intensamente frios que sejam os dias de efectivo frio, estes são cada vez quantitativamente menos, vindo cada vez mais tarde e indo-se cada vez mais cedo do que historicamente costume, inclusive eu que até me tenho como significativamente friorento, no entanto fiz todo o último mês de Dezembro e o próprio Natal em chinelos de enfiar (havaianas). No entanto parece que para a geração ar condicionado a verdadeira notícia é o próprio e normal frio de Inverno _ sinal dos tempos, alta e crescentemente artificiais/virtuais.     
  
            O que sem absoluto prejuízo de quem mais quer que seja, bem mesmo pelo contrário, incluindo desde logo os pais e/ou os avós de todos e de cada um de nós, como seja com natural e incontornável extensão aos primórdios da própria humanidade, mas no entanto por mim mesmo corrente ou futuramente falando, não quer dizer que eu não venha circunstancialmente a morrer de frio ou de calor, mas ao menos (sobre)vivi a ponto de estar a escrever o presente, em grande e substancial medida à margem da geração ar condicionado!

            Ah! E em sequência do inusitado alarmismo mediático e sanitário face ao natural frio climático da época, perante a respectiva reportagem televisiva alusiva ao natural frio invernal muito bem disse uma octogenária da, por esta altura do ano (Janeiro/Inverno), relativamente gélida região rural de Chaves: _ “As pessoas lá de baixo, do Sul, ou que vivem mais protegidas estranham este frio, nós não, para nós é normal!
                                                       III Parte

            Seja que a finalizar, como de resto já referi atrás, para mim pessoalmente a verdadeira noticia neste corrente Inverno seria e é o facto das temperaturas médias até andarem significativa e parece que crescentemente ano após ano demasiado elevadas para a época (Inverno). Quando pelo anacrónica e climaticamente contrário parece que para a geração ar condicionado e verdadeira noticia é mesmo o natural frio de Inverno. Pelo que complementarmente digo ainda que à geração ar condicionado também se pode atribuir o adicional título de geração sol e praia, na medida em que regra geral e tanto quanto possível o que se quer é sol, calor e praia, logo não admira que o próprio Inverno acabe por tornar-se motivo de notícia mediática e de alerta sanitário em e por si só. Salvo que como também há uns crescentes alertas mediático-sanitários de calor durante o Verão, mais das vezes alusivos a relativamente normais temperaturas entre os 35º e os 41/2º graus positivos, neste último caso se poderem atribuir também ainda a uma geração crescentemente sensacionalista/alarmista e mediática/virtualmente artificial. Isto quando salvo puro, duro e generalizado cataclismo, de resto jamais se deixou de viver e de morrer, no limite também de frio ou de calor, que inclusive no caso do calor nem mesmo quando por mais alertas mediático-sanitários que se façam deixa inclusive de livre e dalgum modo até culturalmente, com base no culto da imagem exterior e do respectivo bronze, haver pessoas estiradas durante horas seguidas ao sol nas mais escaldantes horas de Verão _em alguns casos (quase) criminalmente acompanhadas de crianças de tenra idade. Pelo que sem prejuízo de que segundo individual ou colectivamente entendamos ou necessitemos naturalmente proteger-nos dos em si mesmos naturais factores climáticos, frio e calor, etc., em qualquer caso incluindo ou excluindo alarmistas alertas mediático-sanitários, acima de tudo tenhamos um pouco de consciente bom senso, na circunstancia de entre a nossa existência humana cada vez mais e mais artificial/virtual face à primordial natureza vital/climática.

            Seja ainda que sem tão pouco prejuízo de onde e como o literalmente dito ar condicionado faça mínimo ou indispensável sentido humano, no entanto o ar condicionado por si só não nos salva, se bem analisado, desde logo pelo choque de entre a geração ar condicionado e o próprio clima natural, quiçá se adoeça e morra tanto ou mais de entre esse choque do que pelo próprio clima natural em e por si só _ sem já falar nos nefastos efeitos dos artificiais condicionalismos humanos sobre o próprio clima atmosférico e a respectiva vida natural, de que em qualquer destes últimos casos a própria humanidade é parte integrante e/ou dependente.     

            VB   

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